quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

A PEDIDO DE VÁRIAS FAMÍLIAS...

... e já com autorização da dona, segue o conto que a Calos recebeu no Natal.
Por favor não tenham grandes expectativas, a Calos é uma comentadora muito suspeita.

O PASTOR, O PESCADOR E A PADEIRA
Era uma vez um homem que era pastor de pássaros. Todas as manhãs atravessava a aldeia e caminhava, para lá do rio, para lá dos canaviais, para lá da serra e levava o seu rebanho para as pastagens sem fim. Para a serra que fica depois da serra que se vê. Para serra que não se vê.
Chegado ao cimo da serra que não se vê, largava o rebanho à solta e sentava-se a pensar. Porque o trabalho de um pastor é pensar, o rebanho só serve para lhe fazer companhia.
Era uma vez um homem que era pescador de sonhos. Ora pescava à linha ora pescava à rede. Pescava de dia ou de noite, alumiado com uma candeia de azeite. Tanto podia apanhar canastras e canastras de sonhos numa tarde de trabalho, como regressar a casa de saco vazio dias e dias de seguida.
Nos dias áridos que não são bons para a safra, fechava-se num quarto e catalogava cuidadosamente os sonhos que apanhava. Separava-os por categorias e deitava fora os partidos, os estragados e os repetidos. Guardava só alguns dos repetidos, para ter para a troca, se algum dia lhe surgisse a oportunidade.
Era uma vez uma mulher que era padeira de mágoas. Às segundas quintas e sábados levantava-se de madrugada para acender o forno. Depois amassava angústias com amarguras. Não precisava de misturar fermento, as mágoas levedam e crescem sozinhas.
Depois de cozidas, cada mágoa seguia o seu caminho, sem que ninguém a viesse buscar. É uma coisa em que as mágoas são boas, encontram por si o seu dono. São muito independentes.
Um dia o pescador pescou um sonho de pássaros grandes e negros que voavam em voltas por cima de uma serra muito alta.
O pescador conseguia ver sobre a serra um homem, sentado no chão, encostado a uma penha, muito pequeno, porque o via pelos olhos dos pássaros.
Conseguiu ver a mágoa a chegar e a encostar-se devagarinho ao pastor adormecido.
Conseguiu vê-lo a acordar, estremunhado, com o calor da mágoa acabada de cozer, mas não conseguiu distinguir o espanto nos seus olhos, porque os pássaros voavam muito alto.
Depois o pescador começou a ver outras serras e outras aldeias porque os pássaros voaram para longe. E lá ao fundo o mar.
O rebanho abandonou o seu pastor, porque tudo o que se segue a uma mágoa é irremediável.
Quando a morte encontrou o pastor era já madrugada e as ervas estavam molhadas de orvalho, mas não de lágrimas, porque os mortos não choram.

7 comentários:

Vera Ferreira disse...

Feridas, e se gambiassemos a do pinto lopes os teus moinhos da fonte na piação dos xarales do Ninhou? Um soletra em duas do badelo para o Jardim do Camões? És antónio forno do ambroseio? E se a filha do fernando Calos jordar patente neste engenho, jordamos um soletra um podê de grave.

Eu fui antónio forno ancho do teu moinho da fonte. Que a tua do pinto lopes não escadeire na do casal farto e que na tua chaveca catrefas e catrefas de ambroseios mirantem a borboleta para que os covanos e covanas soletrem moinhos da fonte com esta gravidade.

Anónimo disse...

Está maravilhoso. Parabéns! Concordo com a Calos, acho que há para aí muito boa gente com muitos livros editados que não tem o teu nível de escrita. Força! Sem força e vontade nada se faz. E tu tens tudo para lá chegar.

AM

Feridas disse...

Aijasus quem me traz um babete?!...

Anónimo disse...

Muito bom,já agora Feridas explica-me uma coisa porque é que os contos estão quase sempre relacionados com finais tristes e com a morte é que eu não percebo nada disso,mas os contos que conto á minha filha são todos assim.


Ass Marruas.

Feridas disse...

Geralmente os contos infantis não são assim, a maioria tem um final feliz. Mas também há a menina dos fósforos, que ainda hoje me arrepia. Acho que até é bom que as crianças lidem de uma forma natural com a morte e as tristezas, pelo menos não transforma esses temas em tabus.
Mas os contos para adultos acabam mal, ou acabam bem ou...não acabam...

Anónimo disse...

Dears:
Gostei muito deste conto tão simbólico e enigmático! Realmente já tenho lido bem pior e de renome...Concordo com a Vera, há que publicar e chegar mais longe, "ai,tou chêinha dinveja"!!!
Quanto aos contos, há os infantis e os populares, muitas vezes são os mesmos mas os últimos têm sempre uma moralidade, pretendem ensinar o bem mostrando o mal. Este conto não se enquadra em nenhuma das categorias mas é do melhor que tenho lido ultimamente! Congrats!

Feridas disse...

Como diria a Sun, "Cárrêgaaado d' simbôlogia!