J. Rentes de Carvalho era para mim um total desconhecido até a querida Feridas, no meu aniversário, me ter oferecido o seu livro autobiográfico Ernestina.
Depois de o ler tive a consciência que tinha descoberto um génio. Um mestre. Um escritor absolutamente mágico e encantador, daqueles que faz "kamasutra" com as palavras. Depois de o mesmo me ser dado a conhecer, parece que todo o mundo, ou melhor, todo o Portugal, o descobriu ao mesmo tempo: Livro do dia na TSF, nos blogs, na TV, não se falava de outra coisa. J. Rentes de Carvalho tinha definitivamente invadido a literatura portuguesa.
O homem nasceu há 85 anos em Vila Nova de Gaia e por razões políticas foi obrigado a sair do país. Viveu no Brasil, Nova Iorque, Paris e Amesterdão, onde assentou arraiais, leccionou literatura na universidade e onde escreveu grande parte da sua obra e arrecadou inúmeros prémios literários.
No Sábado, estava eu na Feira do Livro quando, entre os inúmeros anúncios de sessões de autógrafos a decorrer na feira (ao fim de semana são dezenas...), ouço o nome J. Rentes de Carvalho.
Fiquei com o nariz no ar e depressa me fiz ao caminho, acreditando que, chegando lá, a fila para conhecer o senhor e conseguir um autografo daria 3 voltas à feira. Nada disso. Ser desconhecido do público e não ser um escritor promovido por grandes campanhas de marketing pode ser uma grande vantagem em certas alturas. J. Rentes de Carvalho não tinha ninguém. Ninguém!...Dá para acreditar?!
O senhor, do alto dos seus 85 anos, já não tem pressas. Calmo, sereno, conversador, vê-se que gosta de saborear cada instante da sua vida com a consciência que a mesma caminha para o fim e que já não resta muito tempo...
Conversou, conversou,...perguntou, explicou,...disse-me coisas engraçadas que não esqueci, como por exemplo que "ler algo de alguém é um acto de extrema intimidade, quase erótico, e todos os maridos deveriam ter ciúmes quando as mulheres lêem na cama um livro de alguém."
Curioso...
"- Detesto o meu nome José! Detesto mesmo! Quando era miúdo chamavam-me Joselito! É horrível. No Brasil descobri que há umas balas, uns rebuçados, que se chamam Joselitos!"
- O que conta em Ernestina é tudo verdade?...
Com um sorriso maroto:
- Não sei, já não me lembro, já foi há tanto tempo...
- Porque é que foi quase desconhecido em Portugal durante tantos anos, apesar de ser um escritor premiado internacionalmente? Foi uma opção?
( A primeira edição portuguesa de um livro de J. Rentes é em 2008, o senhor já tinha 78 anos...)
- Os grandes escritores são fabricados pelo marketing das editoras. Ou melhor, não os grandes escritores, os escritores que vendem mais...
Verdade!
A Feridas disse-me um dia que gostava tanto de Gabriel Garcia Marquez que vivia numa ansiedade constante na esperança de mais um romance antes do escritor bater a bota. Percebi o que ela sentia naquela conversa com J. Rentes. É um homem cansado. Vê-se que transborda de histórias e coisas para dizer. A sua mente galopa, ágil e astuta, mas está aprisionada a um corpo gasto, demasiado vivido. Gostei muito daquela conversa. Muito mesmo. Porque foi uma conversa descontraída, calma, própria de quem já não tem pressa de viver.
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