Feridas e calos: duas amigas com coisas para dizer ao mundo. Sim, nós sabemos, as mulheres têm sempre coisas para dizer, e têm sempre razão!... Acontece que estas coisas são mesmo importante e por isso têm de ficar registadas para a posteridade. Agora a sério: isto não tem interesse nenhum, portanto fuja daqui enquanto é tempo!... E para os Xarales que nos soletrem: Viva o Ninhou!
sexta-feira, 2 de novembro de 2012
CLUBE ESTEFÂNIA
Quando era pequena e vivia em Lisboa, tinha aulas de ballet no Clube Estefânia. Ia sózinha, de autocarro. O que eram esse tempos: tinha 7 anos e ia sózinha do Campo Pequeno à Estefânia duas vezes por semana. Às vezes ia de autocarro, outras a pé. Quando não ia a pé, apanhava o autocarro ao pé do Técnico e saía antes do largo D. Estefânia, para gastar apenas um módulo de autocarro. Quando vinha a pé, passava em frente ao busto de Cesário Verde num jardim, e a via as gotas de chuva a brilhar às luzes dos carros, quando era Inverno, chovia e já estava escuro.
O Clube Estefânia é um local estranho, porque os vários andares descem-se, em vez de se subirem. Entra-se para um átrio e vão-se descendo escadas e escadas. Num andar estava a sala onde as meninas se vestiam e deixavam as suas coisas numa mesa de ping-pong colocada a meio da sala. Descia-se mais um andar e estava-se no balcão do teatro, descia-se outro e estavamos finalmente na plateia, onde não havia cadeiras, porque funcionava ao mesmo tempo como salão de bailes aos domingos e sala para as aulas de ballet.
O Clube Estefânia, fui investigar, foi fundado em 1890 e foi lá que a Eunice Munoz se estreou - sei em que peça: no Frei Luís de Sousa, fazia de Maria - cheirava sempre a bafio, pó e cera de madeiras. Eu adorava aquele cheiro e sempre que lá entrava inspirava fundo para sorver todo o odor que se desprendia das cortinas de veludo gastas e dos cantos dos tectos muito altos.
A sala de aulas, grande, como um pavilhão, era de soalho e ao canto havia uma caixa de madeira com cristais de resina onde esfregavamos as sapatilhas para não escorregar na madeira.
A minha professora chama-se Mercês e dizia que era gordinha e anafada. Não me lembro. Só me lembro de ser baixinha, quase da nossa altura, meninas de 7 e 8 anos.
Usavamos maillots de malha azul, muito feios, com uma saia, que só se podiam comprar nos Porfírio's, com uma carta assinada pela professora, porque eram exclusivos para as suas alunas. Ir aos Porfírio's com uma carta da professora a autorizar a compra de um maillot fazia-me sentir importante.
Eu queria ser bailaria, mas não tinha grande futuro, porque, dizia a professora, tinha bons braços mas péssimas pernas.
Foi pena não ter sido bailarina. Podia dançar sempre sentada, para não mostrar as pernas, só os braços.
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